
Passar pela transição capilar não é nada fácil. Muita gente tem dificuldade para encarar a tesoura e fazer o big chop e procura algum atalho ou alívio nessa jornada. Nessa hora muitos produtos que prometem retorno aos cachos sem precisar cortar. Um dos procedimentos mais famosos é a Desprogressiva, mas também se fala muito na Desintoxicação capilar e no Permanente Afro. Esse texto aborda as principais diferenças entre eles, começando pelo procedimento mais antigo: o permanente afro.
Permanente Afro
O que é permanente afro?
O permanente é um serviço clássico da área da beleza, utilizado para formatação de cachos por meio do Tioglicolato de Amônio.
O Tioglicolato de Amônio é um ativo redutor usado para romper as ligações de enxofre (pontes de dissulfeto) da estrutura capilar, permitindo a transformação química. O líquido permanente tem ph alcalino que dilata a cutícula dos cabelos e penetra o córtex. Com o tioglicolato de amônio é possível alisar, ondular ou cachear um cabelo, dependendo da técnica. O bigoudim ou os bobes são a principal ferramenta desenhar o novo formato dos cabelos. Após a ação do tioglicolato é preciso realizar a neutralização para fixar os cachos. O tipo de neutralizante utilizado geralmente é um oxidante como o peróxido de hidrogênio.
História do permanente afro
As primeiras tentativas de criar um sistema de ondulação permanente são atribuídas ao cabeleireiro, Karl Nessler, por volta de 1906 em Paris. Ele utilizava uma química de transformação, cilindros onde enrolava os cabelos e o calor de uma espécie de secador. Inicialmente o experimento falhou, mas foi aperfeiçoado aos poucos. Entre 1930 e 1940 a técnica já era mais promissora e segura.

O auge do permanente afro foi nos anos 80, quando celebridades como Madonna, Whitney Houston, Cher e estrelas de cinema exibiam cabelos com bastante volume, cachos e textura.

Temos basicamente 2 tipos de permanente nesse contexto:
Permanente convencional
Permanente convencional foi muito utilizado em cabelos lisos caucasianos, trazendo mais movimento e textura, criando desde ondas até cachos mais abertos. Sim, pasmem: até em quem era lisa queria volumão na época.
Permanente Afro
O permanente afro por sua vez, é realizado em cabelos crespos, visando criar, definir ou intensificar cachos bem definidos. O objetivo principal é estruturar os fios de forma duradoura em formato espiralado.
O permanente afro nos EUA e Japão
Durante os anos 70 e 80, o permanente foi moda em vários países. Nos EUA, a valorização da estética negra e do cabelo afro estavam fortemente ligadas aos movimentos de direitos civis dos afroamericanos. Embora muitas pessoas negras tivessem naturalmente o cabelo afro, o permanente afro também foi utilizado para texturizar os fios.
O penteado afro “Black Power” era bem estruturado, com volume simétrico e redondinho, muitas vezes feito a partir de um corte perfeitamente geométrico e com auxílio de pente garfo.
Até mesmo no contexto asiático, o permanente afro ganhou força. Ainda na década de 70 e 80, muitos países asiáticos viviam um período de grande modernização e influência ocidental e a estética do cabelo volumoso e cacheado chegou com tudo.
O Japão foi um dos primeiros países a dominar a técnica de uso do tioglicolato de amônio de maneira precisa e segura para alisamentos permanentes. Aos poucos, os cosméticos japoneses começaram a exportar tecnologia capilar baseada em tioglicolato para o mundo todo.
No Japão até hoje existem espaços que oferecem Surgiram salões especializados em afro perm, para dar um novo formato ao cabelo.
4 verdades sobre o permanente afro
- Se você construir um cacho muito diferente da sua estrutura original, terá alta manutenção, com necessidade de retoque frequente porque haverá muita diferença entre raiz e pontas. Portanto, adotar uma curvatura mais próxima do natural facilitará sua vida.
- O permanente afro é uma química forte com pH alcalino, entre 9 e 10. Ou seja, é bem dilatador. É essencial realizar um teste de mecha e prova de toque antes do procedimento porque ele não é compatível com todas as químicas capilares. O cabelo precisa estar saudável e resistente para suportar o processo e demanda cuidados específicos no pós procedimento para manter a resistência e evitar a porosidade excessiva.
- O Tioglicolato de Amônio é um ativo transformador muito tradicional e eficaz para reduzir volume, cachear ou alisar os cabelos. Em função dessa versatilidade, é importante que a aplicação seja feita por um profissional a partir de avaliação capilar e critério técnico. A aplicação errada pode gerar quebra e/ou emborrachamento dos fios. Além disso, a força do ativo e o tempo de pausa incorretos podem acarretar um formato indesejado dos cabelos: ao invés de obter cachos você pode ter os fios esticados, perdendo a formatação.
- A aplicação do Tioglicolato de Amônio é totalmente diferente dos relaxamentos com hidróxidos (sódio, cálcio, guanidina). A indução do efeito desejado não é feita penteando e esticando para induzir a mudança da textura. No tioglicolato de amônio o segredo está na escolha do produto, boa distribuição do ativo ao longo mecha (sem excessos), pausa de acordo com o tempo ideal indicado no teste de mecha e neutralização no formato desejado.
Desintoxicação capilar

A Desintoxicação Capilar é uma tecnologia de transformação capilar desenvolvida e patenteada pela marca brasileira Grandha. O ativo é o Tioglicolato de Aminometilpropanol (Tioglicolato de AMP), que atua como um redutor de volume e reorganizador de formato.
A novo método de alisamento e transformação capilar foi desenvolvido como uma alternativa mais segura quando comparada a alisantes que utilizavam formaldeído, glutaraldeído e ácido glioxílico, que foram proibidos pela ANVISA (RDC 409/2020) em função de sua toxicidade.
O Tioglicolato de AMP atua numa faixa de ph próxima ao neutro (cerca de 7,50) e aí está a grande sacada: essa faixa é menos alcalina e dilatadora que o permanente afro com Tioglicolato de Amônio, o que o torna o produto mais tolerante diante de cabelos com histórico de outros procedimentos químicos.
O produto possui regulamentação pela ANVISA, e é considerado seguro e isento de gases tóxicos. O uso é exclusivamente profissional.
Existem várias técnicas para formatar ondas e cachos com o Tioglicolato de AMP, uma das mais conhecidas é o uso bigoudim.
Quando falamos do processo de retorno aos cachos para cabelos em transição capilar utilizando o Tioglicolato de AMP, o serviço é chamado de Desintoxicação capilar.
O Tioglicolato de AMP também é utilizado para redução de volume ou para obter uma textura mais aberta e mais lisa, sendo chamado de alisamento ético.
Uma curiosidade: essas imagens de antes e depois são um trabalho técnico de Desintoxicação Capilar feito com Tioglicolato de AMP durante um curso de aperfeiçoamento.
4 verdades sobre a Desintoxicação capilar
- O teste de mecha é essencial para saber se o cabelo vai fixar o cacho após neutralização. Muitos cabelos foram tão agredidos durante anos que não suportam passar por uma nova química mesmo que seja mais suave.
- Assim como o Tioglicolato de Amônio, o Tioglicolato de AMP é versátil e consegue alisar, reduzir volume ou cachear os cabelos, conforme a técnica e força aplicada.
- Se você continuar escovando e pranchando seu cabelo, vai estimular o alisamento térmico e não terá definição. A ideia é fazer a desintoxicação e continuar estimulando a definição com produtos para cachos e finalizações naturais ou com difusor.
- A Desintoxicação capilar é uma forma de auxiliar no equilíbrio de textura entre a raiz e as pontas. Contudo, isso não significa que você não vai precisar cortar em algum momento. Um bom corte valoriza os cachos, distribui volume e retira pontas danificadas.
O que é Desprogressiva?
Enfim, chegamos às Desprogressivas. Elas foram alvo de muitas polêmicas já que muita gente acredita que o nome induz ao erro. Ou seja: faz acreditar que existe um processo que é capaz de reverter os efeitos de uma escova progressiva.
Vamos aos fatos: para quem quer voltar ao natural, a alternativa é fazer a transição capilar aos poucos. Para quem não quer esperar, a solução é recorrer a uma química capilar de transformação. Não tem mágica e não tem milagre.
Desprogressiva funciona? Qual é o ativo usado na desprogressiva?
O que o mercado chama de Desprogressiva ainda é um algo nebuloso já que nem todas as marcas deixam claro para o cliente qual é o ativo transformador utilizado. Aí está o maior ponto de preocupação. Como usar uma química desconhecida nos cabelos?
Algumas “Desprogressivas” oferecem apenas efeito condicionante. Ou seja: a fórmula é semelhante a uma máscara de hidratação convencional para controlar frizz, dar brilho e deixar mais maleável. Nesse caso, esse tipo de “desprogressiva” não funciona para cachear um comprimento de mecha alisado 👎. Aqui você corre o risco de comprar e se decepcionar por não obter o resultado almejado de cacheado imediato.
Outras “desprogressivas” disponíveis no mercado contém o Tioglicolato de Amônio na composição, sendo portanto uma espécie de permanente. Nesse caso, elas geralmente funcionam sim para remodelar os cachos mas exigirão teste de mecha e todos os cuidados já que estamos falando de uma química de alterará a estrutura dos cabelos.
E por fim, temos aquelas cujo pH é ácido e a composição se assemelha muito a escovas ácidas como botox e selagem. Socorro né?
Quanto tempo dura uma desprogressiva no cabelo?
A resposta depende de qual produto e qual ativo foi utilizado no seu cabelo. A duração da desprogressiva pode variar de uma lavagem até meses ou anos.
Como expliquei acima, algumas “Desprogressivas” oferecem um efeito de máscara de tratamento, portanto não oferecem definição prolongada. Se você pesquisar no Reclame Aqui, verá muitas queixas de consumidoras de diversas marcas que relatam que o efeito dos cachos durou apenas uma lavagem.
Se o ativo utilizado for um Tioglicolato de Amônio, o efeito tende a ser mais douradouro, embora retoques de raiz possam ser indicados dependendo da curvatura utilizada no bigoudim e da sua curvatura natural. Quanto mais diferentes elas são, mais retoques frequentes são demandados. Geralmente o retoque de um permanente é de 3 a 6 meses ou conforme houver uma raiz grande o suficiente para trabalhar o ativo com segurança.
Algumas pessoas lançam mão desse tipo de química só uma vez, para minimizar a diferença de raiz na transição capilar e facilitar a finalização. Ou seja, fazem apenas uma vez e depois deixam o natural crescer aos poucos, cortando devagar.
Quanto custa em média uma desprogressiva?
Serviços de beleza possuem uma grande variação de preços. Em média, uma transformação desse tipo varia de R$200 a R$1300 dependendo da região do país, do produto utilizado, do comprimento e densidade dos cabelos.
Jogando a real:
O que fazer para acelerar a retirada da progressiva?
Quanto mais rápido seu cabelo crescer, mais rápido você vai se livrar da progressiva. Então para favorecer as condições de crescimento, o ideal é manter uma alimentação equilibrada e um consumo de água adequado. Também vale a pena investir em produtos para cuidar da saúde do couro cabeludo, estimulando por meio de massagens e tônicos. E enfim, o corte parcial ou total vai te ajudar a se livrar da progressiva.
5 verdades sobre a Desprogressiva:
- Nenhum produto 100% natural e sem químicas de transformação vai conseguir fazer você retornar aos cachos.
- Desprogressiva com receitas caseiras infelizmente não funcionam.
- Nem todas as marcas disponíveis na internet te contam qual é o ativo presente no produto e isso pode representar um risco para sua saúde capilar.
Opinião da profissional
Como apaixonada por cabelos naturais e após ter concluído minha transição capilar, criei muita resistência ao uso de procedimentos químicos. Isso porque muitos procedimentos mal sucedidos podem causar danos severos para a haste capilar e para o couro cabeludo.
Contudo, após estudar químicas capilares entendi que:
- Existem profissionais especializados em transformações químicas seguras. Eles fazem parte de um momento diferente, onde muitas mulheres precisam sair das progressivas em função de reações alérgicas e outros problemas de saúde. Então é necessário que esses profissionais existam, estudem muito e possam acolher quem realmente não deseja usar o cabelo natural.
- Sim, muitas mulheres crespas e cacheadas não se identificam com seu cabelo natural ou não acham prático, ou não argumentam não ter tempo para cuidar em casa e por isso optam pelo liso ou por químicas de relaxamento e redução de volume. E ainda existem aquelas que simplesmente gostam de mudar e exercer essa liberdade capilar às vezes alisando, às vezes deixando natural, às vezes colorindo, descolorindo, etc.
Com tudo isso, minha melhor recomendação é sempre planejar e pesquisar antes de fazer uma transformação capilar, entender bem quais serão os cuidados necessários e buscar um profissional capacitado. Fazendo isso, as chances de sucesso são enormes :) Dito isso, bora ser feliz com nosso cabelo!
Por Maressa de Sousa, técnica em Terapia Capilar e cabeleireira especialista em cachos
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